O MEU BRINDE
Pelos finais do século passado, um velho amigo do futebol estrangeiro teve a amabilidade de me saudar com este recado postal: “ o século que aí vem ajustará contas com este nosso que se avizinha do fim”.
Respondi-lhe que só com os instrumentos do passado se podem abrir as portas do futuro. Todo o tempo histórico é tributário do que o antecedeu e projectista do que lhe sucede. Em termos de parábola, um místico francês deixou escrito que a geração dos vivos bebia o vinho que os antepassados tinham produzido enquanto arroteavam as vinhas que os pósteros iriam vindimar.
Esta lei da continuidade, no entanto, respeita em cada época a originalidade criadora e a marca dos homens e dos acontecimentos. Na surpresa do heliocentrismo, Galileu não teria sido Galileu sem Copérnico e Copérnico não o teria sido sem o grego Aristarco de Samos, 500 anos antes de Cristo. Do mesmo modo, Thomas Arnold, redescobridor do fenómeno desportivo, não teria vingado sem o prodigioso aceno da Grécia Antiga, e sem esse pioneiro moderno não veríamos nós hoje, na primeira década do século XXI, um grave sinal no céu dos atletas.
O “Moura Atlético Clube” perfaz este ano sessenta e oito de idade. Se eu tivesse de escolher no vasto mundo das instituições desportivas um exemplo desse legado do século passado, dessa aspiração à síntese da terra e das gentes, dessa admirável teimosia sobre os tumultos da febre humana, dessa bem entrajada modéstia do seu ecletismo, desse segredo da união dos habitantes, ainda hoje a sua matriz inspiradora, não encontraria um grande campo de escolha, mas teria uma referência válida e simpática: o Moura Atlético Clube. O traço distintivo aqui não é o dos números ou das dimensões materiais. Temos de ir buscá-lo à fidelidade ideal, à coesão dos símbolos, ao culto do equilíbrio, no fundo, à vitalidade que o renova e à consciência da sua missão histórica numa terra povoada de lendas em que a sua lenda mais narrada, os seus heróis mais conhecidos e a sua promessa mais fagueira é no estádio que se recolhe e se revigora.
À semelhança de D. João II, que se regia “polla ley e polla grey”, este clube da vitoriosa interioridade lusitana, poderá inscrever como divisa: por Moura, pela sua gente, pelo seu desporto.
É este o meu brinde.
Antero Silva Resende (Ex Presidente da FPF e membro da UEFA)
Pelos finais do século passado, um velho amigo do futebol estrangeiro teve a amabilidade de me saudar com este recado postal: “ o século que aí vem ajustará contas com este nosso que se avizinha do fim”.
Respondi-lhe que só com os instrumentos do passado se podem abrir as portas do futuro. Todo o tempo histórico é tributário do que o antecedeu e projectista do que lhe sucede. Em termos de parábola, um místico francês deixou escrito que a geração dos vivos bebia o vinho que os antepassados tinham produzido enquanto arroteavam as vinhas que os pósteros iriam vindimar.
Esta lei da continuidade, no entanto, respeita em cada época a originalidade criadora e a marca dos homens e dos acontecimentos. Na surpresa do heliocentrismo, Galileu não teria sido Galileu sem Copérnico e Copérnico não o teria sido sem o grego Aristarco de Samos, 500 anos antes de Cristo. Do mesmo modo, Thomas Arnold, redescobridor do fenómeno desportivo, não teria vingado sem o prodigioso aceno da Grécia Antiga, e sem esse pioneiro moderno não veríamos nós hoje, na primeira década do século XXI, um grave sinal no céu dos atletas.
O “Moura Atlético Clube” perfaz este ano sessenta e oito de idade. Se eu tivesse de escolher no vasto mundo das instituições desportivas um exemplo desse legado do século passado, dessa aspiração à síntese da terra e das gentes, dessa admirável teimosia sobre os tumultos da febre humana, dessa bem entrajada modéstia do seu ecletismo, desse segredo da união dos habitantes, ainda hoje a sua matriz inspiradora, não encontraria um grande campo de escolha, mas teria uma referência válida e simpática: o Moura Atlético Clube. O traço distintivo aqui não é o dos números ou das dimensões materiais. Temos de ir buscá-lo à fidelidade ideal, à coesão dos símbolos, ao culto do equilíbrio, no fundo, à vitalidade que o renova e à consciência da sua missão histórica numa terra povoada de lendas em que a sua lenda mais narrada, os seus heróis mais conhecidos e a sua promessa mais fagueira é no estádio que se recolhe e se revigora.
À semelhança de D. João II, que se regia “polla ley e polla grey”, este clube da vitoriosa interioridade lusitana, poderá inscrever como divisa: por Moura, pela sua gente, pelo seu desporto.
É este o meu brinde.
Antero Silva Resende (Ex Presidente da FPF e membro da UEFA)
Texto enviado por Helder Feliciano, presidente da Direcção do MAC, clube que festeja o aniversário no próximo domingo
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